sexta-feira, 7 de setembro de 2007

Sobre sapatos e homens


SAPATO 36 - Raul Seixas

Eu calço é 37
Meu pai me dá 36
Dói, mas no dia seguinte
Aperto meu pé outra vez
Pai, eu já to crescidinho
Pague pra ver, que eu aposto
Vou escolher meu sapato
E andar do jeito que eu gosto
Por que cargas d'água você acha que
Tem o direito
De afogar tudo aquilo que eu
Sinto em meu peito
Você só vai ter o respeito que quer
Na realidade
No dia em que você souber respeitar
A minha vontade
Pai, já tô indo embora
Já escolhi meu sapato
Que não vai mais me apertar

Não sei se é porque a música do Raul foi tão retumbante quando freqüentava mais rodinhas de violão mas, na minha incompreensão do mundo, parecia que precisava sair correndo de onde estava e sumir na multidão. Qualquer coisa que me segurasse a alguma tradição não poderia estar certa. Tudo o que havia sido feito até então pela humanidade estava errado e as coisas que me ensinavam não faziam sentido com as coisas que fazíamos. Meu pai era o grande calo tentando explicar coisas que só agora acho que um dia entenderei.

SAPATO NOVO - Los Hermanos

Bem, como vai você?
Levo assim calado de lá
tudo que sonhei um dia
como se a alegria
recolhesse a mão
pra não me alcançar

Poderia até pensar
que foi tudo sonho
ponho meu sapato novo
e vou passear
sozinho como der
eu vou até a beira
besteira qualquer
nem choro mais
só levo a saudade morena
é tudo que vale a pena

Aí... tudo estava certo e tive uma adolescência feliz, se é que isso é possível. Larguei todos os calçados e amarras. Tive o direito de me revoltar e fui respeitado, até que não adiantou mais e a vida me disse: "boa tarde". Com a ida dele herdei bem mais do que pares de sapatos que nunca quis usar. A segunda música veio a calhar depois de tantos anos repetindo a primeira, precisava mesmo de sapatos novos... existiu na hora certa e tenho certeza que quando ele atravessou a beira, o carinho foi só o que ficou do seu passeio aqui. Deu uma morridinha, como ele gostava de falar: nada de dor de cabeça do outro lado. Confortáveis como as saudades, conforme o tempo vai passando na sola dos meus passos. É tudo o que vale a pena quando se herda um par de sapatos.

Ficou dramático, mas quem garante que não são sempre assim os sentimentos?! Se é subjetivo tá valendo... Na versão Marvin seria assim:

Não vai adiantar,
Chorar vai me fazer sofrer.
Agora é pra valer
Te entreguei o meu melhor
E suas pegadas eu sei de cor.

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