sábado, 25 de julho de 2009

Londres & Londrina

De Londres a Londrina
não é qualquer esquina
qualquer menina,
qualquer neblina
de Londres a londrina
não é pequena sina,
não somos mais longe,
só não é o mesmo clima
de Londrina até Londres
tem som de tangerina
que foge dos sabores
selando dois amores
de Londres a Londrina
não é qualquer esquina
qualquer guitarra
que se arranha que me amarra
me alucina a Inglaterra
de Londres a Londrina
meu amor é teu intacto,
minha cratera é teu impacto
de Londres a Londrina
o oceano se destina
aos rios sem horizonte
sem beijinhos ou ponte,
há paixão que não se ensina
de Londrina até Londres
de Londres a Londrina
faz da nau um verso torto
nosso mar um amor morto
sem peixinhos, sem um porto
de Londres a Londrina.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

Tradição Oral

Meu avô que é vivo é velhinho, e nunca me contou uma só história. Meu avô nunca me disse nada direito, nem dele, nem de ninguém. Só sei dele o que me falam e a tristeza que vejo naqueles olhos de nunca ter sido entendido direito por nenhum neto. Dá muito trabalho ouvir ele.
É como se ele tivesse perdido a Voz; maiúscula, que vai além do som articulado no ar. Hoje só lhe restam atos. Eu o amo, mas a expressão corporal dele não é das mais simples. A depressão veio e foi, veio e foi com o tempo. O álcool não. Perder pessoas queridas só não é pior que perder a si próprio. Uma vez, várias vezes, até hoje troco umas palavras com o Biguá, meu avô.
Um transeunte que anda semicorcunda, ritmadamente pelas calçadas, com os braços para trás do tronco, segurando o cotovelo esquerdo com a mão direita. Andar que combina com o apelido ornitológico. Moreno, cabelos grisalhos e sem a menor perspectiva de calvície, nariz italiano. Faz mais de trinta anos que ele não fala, tem uma traqueostomia permanente na altura do pomo-de-adão e nunca se adaptou com nenhum aparelhinho de voz. Não teve o mesmo sucesso futebolístico que o xará, que chegou a atuar no antigo Água Verde em Curitiba, e depois no Flamengo.
Toda vez que converso com ele temos exclusivamente um assunto: futebol. Acho que foi meu pai quem me ensinou este truque. Ele é corinthiano, eu santista. Meu pai também era santista.
Acho que meu vô tem um sotaque bem do sul do Paraná. Ele é natural de Irati, ou ali de perto. Minhas avós são polonesas, mas o Biguá é uma mistura bem mais heterogênea. Nosso sobrenome é italiano, mas é sabido de todos que a mãe dele (minha bisa) era bugre, o que quer dizer índio do Paraguai lá onde me contaram essa história.
Esta bisa teve cinco ou mais filhos e morreu quando eles ainda eram crianças. Meu bisavô (de quem meu pai tinha muita admiração), vulgo Macaio, segundo me consta recebeu tal alcunha graças a uma marca de fumo.
O velho Macaio entregou um filho para cada padrinho e caiu na esbórnia. O Biguá trabalhou a maior parte da vida na fábrica de fósforos Paraná como gerente de algo. Tem um dos meus tios que também trabalhou lá contando palitos para colocar nas caixinhas. A fábrica era do Macaio e de mais alguns irmãos, eu acho.
Dois dos filhos acabaram fugindo nestas mudanças e não voltaram mais. Só o Benito, que vivia em Uraí. Ele viveu como bóia-fria, virou indigente, e quando teve um câncer de pele bravo foi que o pessoal voluntário do hospital entrou em contato com a família.
Quando o Benito voltou, meu avô teve mais uma das crônicas crises alcoólicas. Não sei o que rolou com os dois, mas na época isso me mostrou o quanto o não-papo devia ser pesado para os dois. O Benito era santista, foi expulso por um surto do vô e depois foi morar lá em casa.
Dos cinco filhos do meu avô, três sairam corinthianos e dois sairam santistas. Meus tios jogaram todos no Cedrinho F.C. de Iraty. Eu nunca fui muito fã de futebol, não ligo muito mesmo e aos quinze anos achei que se tratava do ópio do povo. Meu avô escuta futebol no rádio.
Outro dia fui com dois amigos no estádio assistir um Santos e Corinthians, só que fui na torcida do Corinthians. Que erro! A sensação de não poder torcer pelo seu próprio time é extremamente delicada. Eu não pude gritar gol e precisei simular contentamento com aquela torcida alheia e carrasca. Tudo para não atentar contra minha própria vida quando fomos derrotados ao final do derby.
Um exercício de paciência. A censura de uma expressão tão primária e forte quanto uma torcida é tal que me levou a um estado borderliner de não sei o quê. Eu só topara a princípio a experiência por acreditar na minha parcial impassionalidade com o assunto, mas jamais aconselho tal experiência para ninguém.
Meu avô grita no meio da torcida e ele deve sentir a vida adversária. Mas isso são coisas que me contaram, a Voz dele eu nunca escutei.

domingo, 5 de julho de 2009

Chorume

chorume
se assume como
lágrimas do ido

chorume
tem perfume de
resíduo fluído

chorume
se resume ao
destino líquido

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Moça do busão


Mas... não vou descer do busão
quero saber onde ela mora,
quero saber se ela namora,
se ela gosta da canção
que eu já pensei agora
que ela refutou o botão.

Fecho os olhos para ter
aqueles cabelos tão fininhos
por onde eu tranço os dedos,
puxo firme e me aninho
a descobrir dela os segredos
que só revela com carinho.

Vou dizer que o sorriso dela
mudou o meu itinerário,
e sairei mais depois do horário
pra acompanhar esta donzela.
Chefe, aumente o meu salário
que irá todo em flor pra ela.