terça-feira, 18 de dezembro de 2012

Bar caro é melhor, meu*


Eu sou meio moderno, meio de direita, por isso frequento bares muito bons.
Não sei se você sabe, mas nós, meio modernos, meio de direita, nos julgamos a base do empresariado, desde que consegui este estágio no banco há 15 meses. (Deve ter alguma coisa indo bem com um estágio de mais de 15 meses, confere?)
No bar caro que ando frequentando nas últimas semanas o empreendedor é o Otávio Rosquetta, dono, que cumprimento trocando cartões e acreditando conseguir assim 500 novos clientes pro banco, além de melhorar a imagem.
Nós, meio modernos, meio de direita, adoramos ficar "amigos" do dono, com quem falamos sobre carro enquanto nossos amigos não chegam para falarmos de bebedeira e mulher.
"Ô, Otávio, traz mais um baldinho de Heineken pra gente", eu digo, soltando a gravata, e me sinto parte de Wall Street.
Nós, meio modernos, meio de direita, odiamos fazer parte do Brasil, por isso vamos de camisa longa a bares caros, que têm mais mulher turbinada que os bares ruins, onde tem frango à passarinho ou carne de sol com macaxeira que são os pratos baratos, de quem não tem grana, e não se serve petit gateau.
Se bem que nós, meio modernos, quando convidamos uma mina para sair pela primeira vez, atacamos mais de camarote vip do que tète-a-tète, porque a gente gosta de coisa cara, exclusiva e tal, mas na hora do vamos ver mostrar que tem bastante grana por contraste social é o que conta na Vila Country e micareta.
A gente até gosta do Brasil, mas muito bem dividido. Não é qualquer Brasil. Cada um do seu lado da corda.
Assim como não é qualquer bar caro.
Tem que ser um bar caro novo, um pub, matéria na Vejinha, cerveja importada e, se tiver porção de cebola empanada e área exclusiva, a gente bate uma punheta ali mesmo.
Quando um de nós, meio modernos, meio de direita, descobre um novo bar caro que nenhum outro meio moderno, meio de direita frequenta  não nos contemos: twittamos e marcamos no foursquare a turma inteira de meio modernos, meio de direita e decretamos que aquele lá é o nosso novo bar caro.
Porque a gente acha que o bar caro é moderno e o bar barato não é, como eu já disse.
O problema é que aos poucos o bar caro vai se tornando velho, vai sendo frequentado por vários meio modernos, meio de direita e gostosas mais ou menos turbinadas.
Até que uma hora tem promoção de chopp e aparece escritório de advocacia, contabilidade, happy hour de telemarketing, barangas e nesse ponto a gente já se sente incomodado e quando chega no bar caro e tá cheio de gente que não é nem meio moderna, nem meio de direita e foi lá para ver se tem mesmo promoção, gente com dinheiro e gostosas, a gente diz: eu gostava disso aqui antes, quando só vinha a minha turma de meio modernos, meio de direita, as gostosas mais ou menos turbinadas e uns quarentões endinheirados que andavam de Harley Davidson.
Porque nós, meio modernos, meio de direita, adoramos dizer que frequentávamos o bar antes de ele ficar barato, vamos a tal balada de camarote vip, ouvimos a música nova no repeat com o porta-malas aberto.
Nós até aturamos os intelectuais que estavam na praia antes, uns maconheiros que sabem tocar violão e usam sandália havaiana, mas isso a gente acha sujo, e a gente detesta sobretudo os pobres que chegam depois, de marmita e cheio de filho cagão chorando.
Pobre não mesmo, a gente não gosta de pobre, velho e feio; de brasileiro só os empregados.
E a gente abomina PeTralha, abomina mesmo, acima de tudo.
Os donos dos bares caros que a gente frequenta se dividem em dois tipos: os que entendem a gente e os que não entendem.
Os que entendem percebem qual é a nossa, mantém o bar caro sem promoção, chamam pra evento reservado toda sexta-feira, introduzem petit gateau no cardápio e não aceitam cheque ou que fique sem camisa lá dentro. Só cartão ou dinheiro, de preferência sem troco.
Eles sacam que nós, meio modernos, meio de direita, somos meio inseguros e nos dispomos a pagar mais caro por aquilo que todo mundo acha um abuso absurdo.
Os garçons que entendem qual é a nossa, diante da segregação, trocam insultos bêbados pelos 10% que pagamos, ou não, engolem seco e põem um sorriso estéril no rosto pensando que cada cerveja ali tem o valor de duas horas de seu trabalho.
Aí eles se fodem, porque a gente adora isso, a gente gosta pagar de rico, como já disse algumas vezes, é aquela coisa cada um no seu lugar, tão americana, tão moderna.
Não pense que é fácil ser meio moderno, meio de direita, no Brasil!
Ainda mais porque a cada dia está mais difícil encontrar bares caros do jeito que a gente gosta, os pobres estão todos com carro (fosse no busão), funk e rap ligado no talo, prontos para encher nossos bares caros de gente baranga, pobre e a difundir a cebola empanada pelos quatro cantos do nordeste.
Para desespero dos meio modernos, meio de direita, como eu que, por questões ideológicas, preferem cebola empanada e Guinness stout (que não é a mesma coisa que a pilsen nacional, a qual prefiro mas é barata, nós meio modernos, meio de direita, achamos que a gringa é muito mais moderna que nós preferimos essa marca, Guinness, que é mais assim St. Patrick, saca?).
- Ô Otávio, vê um Johnny Walker aqui pra mim. Tem Red, Green, Black e qual mais?

* este texto é um exercício paráfrase e antônimos ideológicos do texto de "Bar ruim é lindo, bicho" de Antonio Prata

sábado, 1 de dezembro de 2012

Transporte do desejo


Saudosas belezas sexuais, verbo sanguíneo, vivo e banal...
Viro o pescoço apressado pelo corpo,
Pois que nú não o verei nunca, só sua nuca
Tão recíproco e atrasado é nosso percurso
Que mesmo nessa proximidade efêmera, o eterno desejo procura sintonia.
Tanto tempo aqui indo, que nem imagino a volta do sentido contrário.
Tocar, cheirar, apertar, tudo isso não farei pois aqui em minha ciência
Os sumos não terei entre os lábios, nem teria literatura verossímil neste caminho, chupasse com tal afeto que imagino.
São tecidos coloridos pelos quais adverbo o meu deleite com a forma túrgida que revela-esconde o pano.
Minhas orgias e prazeres são abusados nestas figuras que constroem meu êxtase, meu transporte anônimo e estrangeiro em si.
Pego outro e vejo mais corpos que nunca mais, transporte, verei.