terça-feira, 17 de agosto de 2010

Doce


Tu és sorriso largo inevitável.
Teus lábios firmes, teus alarmes...
Contigo o amargo é inefável,
Néctar, doce flor. Da tua idade,
Sorriso largo inabalável desdobra
Em pele que descobre a energia
Enquanto órgão a tocar com mãos.
E mima a boca tua em minha carne,
Te toco toda, te testo o tato,
Te estremeço pelo paladar, olfato.

Pele preta eu te encontraste
Em nossa humana tez contraste.
Do chocolate as tuas fendas flores
Rosas, rubras e escarlates,
Seio botão, doce melado a tua idade,
Fundamental arrimo em meu tempo
De burro velho, sábio amargo;
Dulçor no caos, aprecio com maturidade.
Tu és alívio, avalio-te explendor.
Reluto tanto mas te rimo:
Eu te ensino meu carinho
Se me adoças teu sabor.

terça-feira, 27 de abril de 2010

Colmeia

Tu foste o fim da infância
quando te vi, me vi ereto
e apontando tuas entrâncias
me vi homem, me vi feto.
Aquele ego com moleira
onisciente em ideal
encontrara a violeira,
a roqueira, trash metal,
a mais bela, tais flores vermelhas,
a mais doce, qual o de leite:
Minha ira - mãe de abelhas -
ungindo sexo foste o azeite.

Do meu épico foste rainha,
do cósmico amor em ladainha,
das catedrais de nossas línguas,
do infinito de nossos ouvidos,
atentos de promessas, envolvidos
fez carne, de repente, com pentelhos.
O velho mundo nos fez velhos
e vaguei zangando-me adulto
até entender ser feliz, sem tumulto.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Insipiração

Uma escolha inconsciente,
uma decisão irracional,
uma certeza obscura,
uma realidade absoluta,
uma vida crua e pura
de um amplexo animal.

Compreender como passivo
paradoxo do desejo impossível
é uma energia incrível.
Um sonho acordado e recorrente
de largar o corpo na corrente
entregar-se ao leito da serpente
em núpcias com meu caos.

Um amor que hesita
e um tempo que deu êxito
no teu ventre...
e serei mais gente:
menos belo, mais bonito
quando ouvir o grito
de rebento rebentando
tudo o que era plano
e dando peso aos anos
e sentido sem enganos
ao que era meu conflito.

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2010

Campos de Flores

Drummond de Andrade me ajudando mais do que nunca.

Deus me deu um amor no tempo de madureza,
quando os frutos ou não são colhidos ou sabem a verme.
Deus-ou foi talvez o Diabo-deu-me este amor maduro,
e a um e outro agradeço, pois que tenho um amor.

Pois que tenho um amor, volto aos mitos pretéritos
e outros acrescento aos que amor já criou.
Eis que eu mesmo me torno o mito mais radioso
e talhado em penumbra sou e não sou, mas sou.

Mas sou cada vez mais, eu que não me sabia
e cansado de mim julgava que era o mundo
um vácuo atormentado, um sistema de erros.
Amanhecem de novo as antigas manhãs
que não vivi jamais, pois jamais me sorriram.

Mas me sorriam sempre atrás de tua sombra
imensa e contraída como letra no muro
e só hoje presente.
Deus me deu um amor porque o mereci.
De tantos que já tive ou tiveram em mim,
o sumo se espremeu para fazer vinho
ou foi sangue, talvez, que se armou em coágulo.

E o tempo que levou uma rosa indecisa
a tirar sua cor dessas chamas extintas
era o tempo mais justo. Era tempo de terra.
Onde não há jardim, as flores nascem de um
secreto investimento em formas improváveis.

Hoje tenho um amor e me faço espaçoso
para arrecadar as alfaias de muitos
amantes desgovernados, no mundo, ou triunfantes,
e ao vê-los amorosos e transidos em torno,
o sagrado terror converto em jubilação.

Seu grão de angústia amor já me oferece
na mão esquerda. Enquanto a outra acaricia
os cabelos e a voz e o passo e a arquitetura
e o mistério que além faz os seres preciosos
à visão extasiada.

Mas, porque me tocou um amor crepuscular,
há que amar diferente. De uma grave paciência
ladrilhar minhas mãos. E talvez a ironia
tenha dilacerado a melhor doação.
Há que amar e calar.
Para fora do tempo arrasto meus despojos
e estou vivo na luz que baixa e me confunde.

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Profundidades da alcova

O que é a vida?

Olhando para o teto,
de madrugada,
quase cedo,
p'ra esquerda,
p'ra direita.

Tenho olhos
que não me veem,
só no espelho,
quando tem luz...

O galo canta.

Mas é invertida a imagem,
me olha vazio,
da pupila,
escura,
dilatada,
do escuro.