quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Parábola da Árvore da Vida

Uma das histórias favoritas do meu velho poderia muito bem ter sido tirada de algum livro do Evangelho. Tem a cara de uma daquelas parábolas do "Filho Pródigo"; ou então aquela outra do patrão que distribui "talentos" aos servos. Mas não é. Ela foi um pouco atualizada. Some-se a isso minha novíssima versão e fica assim:

Um menino e seu pai plantaram uma árvore. Era a primeira que o pequeno ajudava algo a nascer. Aquilo não tinha muito sentido na sua cabeça:

- Pai, p'ra quê plantar árvores se elas nascem sozinhas?

- Ora, filho, esta vai crescer aqui onde escolhemos, não precisaremos ir até ao mercado comprar seus frutos e teremos uma frondosa sombra para descansar.

Assim, fez sentido dar vida àquela árvore. O menino aprendeu a cuidar e ter muito carinho pela muda, que logo espichou, multiplicou seus galhos, raízes, folhas, flores e frutos.

Um triste dia, o pai do garoto morreu. O menino que não entendia isso direito, saiu a vagar e neste dia descobriu que podia conversar com o vegetal. Ele chorava porque era muito novinho e sem seu pai não sabia nem como arranjar comida. Foi assim que, num gesto paternal, a árvore ofereceu seus frutos. O piá comeu tudo o que pôde e fez uma baita sujeira. Lambuzou-se e com fiapos entre os dentes aproveitou até o caroço de cada polpa. Cresceu com isso... Estudou, não usou muitas drogas recreativas, exercitava-se regularmente e quase nunca lembrava de visitar a velha amiga árvore...

Num outro dia especial xis, o menino virou um jovem... E conheceu uma moça... quase uma princesa! Por quem se apaixonou. Mas ela era de uma província distante e o nosso protagonista não tinha condições financeiras de vê-la constantemente. Desesperado saiu a caminhar de novo, imaginando alguma solução para seu dilema. Foi conversar com a grande árvore, que temerosa lhe ofereceu os galhos, ainda cheios de flores e frutos para que construísse uma jangada, trocasse por passagens de avião e fosse se aventurar pelo mundo e pelo amor. Nosso jovem conheceu novas terras, desbravou incontáveis províncias e conheceu algumas princesas antes de se decidir.

Eis que o jovem corre o mundo e encontra um amor verdadeiro. Os dois se casam e querem casa nova, o espaço é pouco para tanta gente. Ele e a família precisam de uma casa, mas não há dinheiro para comprar. Um pouco mais maduro (mas não muito), ele volta para visitar a árvore. Depois de muita cerimônia, ele finalmente pede para que sua (já não tão frondosa) amiga lhe dê o tronco. Ela, tremendo de pavor (igual vara verde), entende e se entrega, até restar apenas um toco.

A vida passa, e a casa protege todos do frio e da chuva. Cada um toma seu rumo e o moleque, agora um senhor, sente-se só por vezes. Ele vai até o toco por vezes também... Conversam e lembram sobre suas vidas: o homem conta suas viagens, a árvore suas estações. Ele virou um grande resmungão e se diz, por vezes, cansado da vida e indignado com as atitudes alheias. O toco sempre ouve tranqüilamente e procura compreender. Num rompante curioso, o homem pergunta:

- Ora, porque você sempre foi tão generosa comigo se as árvores nascem sozinhas? Transformei-lhe num toco e nada mais pode oferecer para me ajudar hoje...

A árvore, enquanto toco, se oferece como assento. O homem aceita envergonhado e cansado. O toco dá um profundo suspiro e diz, irradiando felicidade:

- Contemple daí sentado meus brotos nascendo. Todas estas sementes você ajudou a germinar enquanto comia meus frutos, espalhava meu pólen pelo mundo e passou demãos de verniz em sua casa para me eternizar... sou eternamente grata.

Ele olha ao redor e se percebe sentado num toco, o centro do frondoso bosque que virara seu quintal. O toco arremata:

- Me sinto muito feliz por ser o lugar onde você vem refletir sobre a vida, filho.

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